Três décadas atrás, ela não passava de uma mocinha presa no topo de uma pilha de barris esperando que um certo “encanador” viesse resgatá-la. Em 2017, no entanto, Pauline se encontra no topo da vida política em New Donk City, o cenário urbano ficcional do aguardado Super Mario Odyssey para Nintendo Switch!
Imitando o triângulo amoroso que vimos no arcade Popeye (com o qual o arcade de Donkey Kong tem mais algumas semelhanças) Pauline parecia existir apenas como um troféu para ser disputado entre Mario e Donkey Kong, sendo relegada ao papel de “mocinha em perigo”, como vimos tantas outras vezes em diversas histórias.
Quando indagada se estava ou não consciente desse papel, a Nintendo, através de Shigeru Miyamoto, respondeu para o site Kotaku que, como o jogo havia sido desenvolvido para arcades e os títulos da época tinham essa tendência, essa dinâmica parecia uma escolha óbvia.
Dessa maneira, a pobre Pauline foi sendo jogada para um jogo do outro no mesmo papel. Isso só mudou um pouco com a chegada da série de animação Saturday Superarcade, quando ela recebeu uma voz e fazia algo mais (mas não muito) do que servir de troféu:
E então ela desapareceu.
Por um bom tempo nada se ouviu sobre ela. A Nintendo a substituiu pela Princesa Peach, assim como substituiu Donkey Kong por Bowser com a chegada do primeiro Super Mario Bros. Apenas quando a companhia ressuscitou a disputa entre Mario e Donkey Kong com a série Mario vs. Donkey Kong que Pauline, ainda conhecida como “a namorada do encanador”. Mesmo assim, ela ainda não tinha nenhuma grande importância como personagem. A Princesa Peach teve espaço para crescer e agir por si só em Super Mario Bros. 2 e em diversos outros títulos envolvendo Mario nas décadas seguintes (como Mario Kart e Super Smash Bros.).
Pauline, no entanto, continuava destinada a ser capturada, jogo após jogo até que em Mario and Donkey Kong: Minis on the Move ela alcançou algo no nível de emancipação que Candy Kong, de Donkey Kong Country, alcançara anos antes em Donkey Kong 64. Ao invés de estar lá para ser capturada, ela foi promovida à anfitriã de um mini-jogo. Claro, não era nada no nível de Samus Aran (da série Metroid) ou da bruxa Bayonetta, mas ser a anfitriã de Mario vs. Donkey Kong ao menos era algum tipo de progresso, ainda que ínfimo.
E agora, sem nenhum aviso, mas para a nossa alegria, Pauline reapareceu com tudo em Super Mario Odyssey. A nova Prefeita (e cantora) de New Donk City trocou seu vestido vermelho por um terno (pelo menos em algumas cenas) e parece mais preocupada em cuidar de sua emergente metrópole do que em servir de troféu para um encanador ou seus inimigos.
Por que agora? Em uma entrevista com o site Reddit, o produtor Yoshiaki Koizumi explicou o seguinte:
Quando estávamos decidindo que Reinos ter no jogo, nós sabíamos que queríamos um ambiente urbano, e nós queríamos algo que tivesse ressonância entre os jogadores. Nós sabíamos que os jogadadores conheciam Pauline, e então é claro que nós quisemos fazer dela a Prefeita de New Donk City.
Koizumi fez questão de mencionar que, enquanto os cenários do jogo podem ser chamados de “reinos”, nem todos eles são governados por realeza, implicando que Pauline foi eleita para essa posição, o que não deixa de ser interessante quando lembramos que a cidade de Nova Iorque, na qual New Donk City se baseia, nunca elegeu uma mulher para esse cargo.
Koizumi também explicou que ao construírem uma história mais elaborada para Pauline como personagem, também foi o que os levou a decidir que queriam um tema jazzístico com vocais para o tema do jogo:
À medida que desenvolvíamos Pauline mais como uma personagem, nós sabíamos que ela se interessaria por jazz. Foi interessante para nós termos a primeira música cantada em um jogo do Mario.
Mas é possível que as maiores razões pelas quais Pauline foi elevada a essa posição no cenário do novo jogo só sejam mesmo compreendidas e reveladas quando jogarmos Super Mario Odyssey, em outubro. Na mesma entrevista em que Miyamoto explicou como os jogos anteriores da Nintendo sempre se apoiaram no esquema da “mocinha em perigo” (pois até mesmo nesse novo jogo vemos Peach sendo sequestrada por Bowser), ele tentou esclarecer as razões pelas quais a companhia tem sido tão lenta em abandonar esse esquema:
Eu acho, para mim em particular, que a estrutura da jogabilidade sempre vem antes da história. E então estamos sempre prestando atenção nisso quando estamos criando um jogo, em qual é a história mais natural a acontecer dentro daquela estrutura.
Pikmin é um bom exemplo disso. Em Pikmin, a estrutura original da jogabilidade era centrada em todas essas criaturas individuais que se movem por aí como formigas. Como resultado disso, o mundo no qual você se encontra é naturalista e com muita terra, e as criaturas contra as quais você luta se parecem com insetos, porque é nisso que a jogabilidade se foca.
Então, se terminarmos criando uma estrutura de jogabilidade onde faça sentido para, seja uma mulher ir resgatar um homem, ou um homem gay ir resgatar uma lésbica, ou uma lésbica resgatar um homem gay, nós poderíamos seguir essa abordagem. Para nós, tem menos a ver com a história e mais com a estrutura da jogabilidade e o que faz sentido estarmos apresentando ao consumidor.
Enquanto podemos debater se a explicação de Miyamoto faz sentido ou se ela é apenas baseada em noções antiquadas de gênero e identidade, não é possível negar que a Nintendo sempre se mostrou mais preocupada com a jogabilidade de seus jogos do que em desenvolver narrativas mais “profundas”.
Mesmo, então, que não seja uma explicação completamente satisfatória para o fato de que Pauline tenha sido relegada ao papel de “mocinha em perigo” todos esses anos, ela sugere que seu papel maior no novo jogo – o primeiro em que ela aparece ao lado de Mario sem Donkey Kong (ao menos pelo que vimos até agora) pode ser maior do que o que vimos nos trailers e gameplays liberados até agora.
Fonte: Kotaku
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